Circovírus Suíno Tipo 2: complexidade e implicações na produção suína

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Genótipos PCV2b e PCV2d têm sido relatados com maior predominância no Brasil, prejudicando a rentabilidade e a produtividade das granjas.

O Circovírus suíno tipo 2 ou PCV2, como é mundialmente conhecido, apesar de pequeno, consta como o menor vírus de replicação livre conhecido em todos os vertebrados, seus impactos podem ser enormes. Conhecido há mais de duas décadas, sabe-se que está envolvido com uma ampla gama de doenças e problemas de produção em suínos, principalmente síndrome de definhamento multissistêmico pós-desmame (PMWS), síndrome da nefropatia por dermatite suína (PDNS), além de problemas reprodutivos associados ao PCV2. O que tem desafiado a sanidade e lucratividade dos plantéis, na situação atual, é sua atuação no complexo de doenças respiratórias suínas (PRDC) e na doença subclínica.

Outro ponto a salientar na sua dinâmica é capacidade de envolvimento de outro patógeno para desencadeamento do quadro clínico, destacando a natureza complexa e multifatorial da Doença Associada ao PCV2 (PCVAD).

Sabe-se também que o PCV2 afeta o funcionamento do sistema imunológico dos suínos. Os impactos imunomoduladores são observados na patologia do PCV2 nos tecidos linfoides durante a doença clínica e na exacerbação de outras doenças já presentes no rebanho, assim como alguns estudos mostraram que a infecção pelo PCV2 pode afetar a resposta a outras vacinas.

A forma mais comum da doença causada pelo PCV2 é a subclínica, onde não há sinais clínicos claros, nenhuma ou mínimas lesões, moderada ou baixa quantidade de vírus PCV2 presente no suíno, associada a uma perda de performance, como diminuição no ganho de peso médio diário. Segundo Alarcon et al (2013), o custo da infecção subclínica por PCV2 quando o suíno não vem a óbito, mas perde em eficiência produtiva, é de 8,10 libras por suíno afetado, que chega ao abate, o que corresponde a uma perda de 58,6 reais** por suíno afetado.

Nem sempre é fácil perceber as perdas causadas pela infecção subclínica do PCV2, pois as taxas de crescimento impactadas pela doença, embora abaixo do potencial genético do rebanho, podem ser percebidas como “normais” e assim comprometer a rentabilidade da produção.

Utilizando as informações de Alarcon, se consideramos os suínos em terminação provenientes de um plantel de 1000 matrizes, onde 20% da produção destas é afetada pela infecção subclínica do PCV2 e chegam até o abate, as perdas podem ultrapassar 45 mil libras ao ano, ou 325,8 mil reais ao ano**.

Definição de Alarcon et al, de caso subclínico: Suíno infectado com PCV2 que não apresenta PMWS clínica, mas apresenta crescimento reduzido e susceptibilidade aumentada a outras coinfecções.

A ocorrência de alguns surtos e, em maior escala, a doença subclínica associada ao PCV2 tem desafiado veterinários e pesquisadores a entender o porquê destes ocorridos, considerando o cenário onde os suínos são imunizados com vacinas em sua maioria compostas por PCV2a.

Estudo a respeito da diversidade gênica do PCV2 tem sugerido o envolvimento direto de genótipos heterólogos a aqueles presentes nas vacinas fornecidas aos suínos. Em estudo apresentado por Gava et al (2018), em 11 suínos provenientes de granjas do sul do Brasil com doença sistêmica de PCV2, foi identificada a presença de PCV2b (81,8%) e PCV2d (18,2%). A comparação entre as sequências de aminoácidos da ORF2 dos isolados de PCV2 revelou alterações de aminoácidos em importantes regiões relacionadas ao reconhecimento de anticorpos, o que pode levar a uma ligação ineficiente de anticorpos, e este pode ser um mecanismo relevante nas falhas de proteção destes suínos.

Uma análise recente das sequências genéticas do circovírus suíno tipo 2 (PCV2) mostra que até 25% das cepas de campo são recombinantes de diversos genótipos, destacando a importância da proteção ampla ao selecionar uma vacina contra o PCV2.

A recombinação ocorre quando dois vírus co-infectam uma única célula e geram descendentes que compartilham frações da sequência genética de ambos os pais.

Levantamento apresentado por Franzo & Segalez (2018), a partir de 4.586 sequências da ORF2 de PCV2, apontou que até o ano de 2011 os genótipos PCV2a e PCV2b eram os mais relatados, mas desde 2014 o PCV2d tem sido o mais reportado em nível global. Esta predominância do PCV2d nos registros do GenBank também fora evidenciada por Sayers et al (2020).

No Brasil, um estudo inédito apresentado por Nascimento et al (2020) obteve 27 amostras clínicas coletadas no ano de 2019 em cinco diferentes estados brasileiros, oriundas de rebanhos vacinados para PCV2 e que apresentavam sinais compatíveis com doença associada ao PCV2 (PCVAD).

Após o sequenciamento da ORF2 destas amostras, 33,3% foram caracterizadas como PCV2b e 66,7% como PCV2d. O cenário do PCV2 está evoluindo rapidamente e inclui uma alta porcentagem de vírus recombinantes, com a maioria incluindo segmentos de genes do PCV2a, b e d, o que reforça a importância de uma ampla cobertura ao selecionar uma vacina contra o PCV2.

A cobertura antigênica de duas vacinas comerciais foi avaliada para determinar qual tinha o melhor potencial para a ampla cobertura contra cepas de campo de PCV2 recombinantes.

Nesse estudo, os cientistas analisaram os epítopos de células T, a parte do antígeno viral que é reconhecida pelas células T, as quais desempenham um papel vital na resposta imune, matando células infectadas, inclusive as infectadas com PCV2.

Usando um processo computadorizado de Comparação do Conteúdo de Epítopos (EpiCC), os cientistas caracterizaram epítopos de células T para 30 sequências de PCV2 provenientes de granjas brasileiras. Eles, então, testaram duas vacinas comerciais de PCV-2:  a primeira, uma vacina bivalente que contém PCV-2a e PCV-2b e a segunda, uma vacina contendo apenas PCV2a, quanto a quantidade e qualidade dos epítopos de células T, que tinham em comum com essas sequências.

A análise EpiCC, traça a cobertura das vacinas contra os genótipos predominantes de PCV2, o que permite prever a resposta imune de diferentes vacinas aos vírus que os suínos estão expostos a campo.

A análise mostrou que a primeira vacina apresentou o maior número de epítopos de células T em comum com os epítopos de células T dos vírus oriundos de granjas brasileiras, apresentando uma cobertura 38% maior que a vacina que continha apenas PCV2a.

 

* Texto elaborado por Dalvan Carlo Veit, médico veterinário, gerente técnico de Suínos da Zoetis.
** 1,00 libras = 7,24 reais (Cambio de 31/07/2024).

 

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